198 Livros: Bósnia e Herzegovina – Como o Soldado Conserta o Gramofone

198 Livros - Bósnia e HerzegovinaO tema “guerras” com certeza vai aparecer muitas vezes por aqui até o final dessa viagem pelo mundo da literatura. Ainda estamos no início do projeto e já é a terceira vez que uma guerra dita os rumos dos personagens do livro, como aconteceu indiretamente na República Tcheca e fortemente em Ruanda. Não importa se uma guerra civil ou uma guerra mundial, qualquer uma delas deixa cicatrizes profundas em quem é atingido. São necessárias várias gerações para que os efeitos deixados se suavizem e as feridas comecem a sarar. Não é à toa que a 2ª Guerra Mundial ainda seja um assunto recorrente na literatura. Mais de meio século se passou, mas as marcas deixadas ainda parecem ser recentes.

A Guerra da Bósnia ou o genocídio em Ruanda me impressionaram muito por terem acontecido tão recentemente, mas o mais triste é pensar que essas histórias ainda não viraram passado e que nesse exato momento outros conflitos estão em curso pelo mundo. Meu conhecimento sobre o assunto é (felizmente) bem limitado e distante, mas imagino que seja impossível que a vida siga seu curso normal após testemunhar um genocídio. Isso ficou bem claro em The Past Ahead, o livro de Ruanda, e também no livro da Bósnia e Herzegovina. Como o soldado conserta o gramofone - Saša Stanišic

Como o soldado conserta o gramofone, de Saša Stanišic, nos conta a história de Aleksandar, uma criança cheia de imaginação cuja vida é sacudida pela Guerra da Bósnia. Conhecemos a guerra através de sua voz infantil, num enredo em que realidade e imaginação se misturam a todo momento. O livro é uma tentativa de tentar expressar em palavras os horrores que abalaram Višegrad, a cidade natal de Aleksandar e também do autor. Não sabemos ao certo sua idade no início do livro, apenas que é algo “entre oito e catorze, conforme for mais conveniente, mas de qualquer modo velho demais para ser beliscado nas bochechas”.

A história começa com a morte de seu avô Slavko, um nacionalista sérvio que foi o grande incentivador da veia inventiva de Aleksandar e que continuou sendo sua maior referência durante toda a vida. De forma mais ou menos cronológica, acompanhamos seu luto pela perda do avô e a chegada da guerra que invade sua casa e leva sua família ao exílio. Aleksandar representa bem a situação da recém-extinta Iugoslávia naquele momento: ele é “uma mistura, um meio a meio, um mestiço”, filho de pai sérvio e mãe bósnia, assim como o autor do livro.

Na segunda parte do livro, Aleksandar vive na Alemanha e usa a narração como uma forma de tentar entender seus próprios sentimentos, como faz Isaro em The Past Ahead. Só que, ao contrário de Isaro, que preferiu a ficção, ele se apega às próprias memórias, muitas vezes mescladas com a imaginação típica da infância. São relatos de momentos de “quando tudo era bom”, de quando suas maiores preocupações eram os jogos de futebol ou o campeonato de pesca no rio Drina, antes da chegada da guerra. Um pacote de lembranças enviado por sua vó Katarina (que “tinha o nome certo” e por isso pôde permanecer na Bósnia) desperta nele uma enxurrada de lembranças que por algum tempo podem ter ficado adormecidas.

A última parte do livro se passa em 2002, quando Aleksandar volta a Višegrad, 10 anos após sua partida. Ele retorna ao seu país de origem pela primeira vez com uma lista de lugares e pessoas que ele deseja rever, mas sem saber se elas estarão como ele as deixou. Nesse percurso ele busca por Asija, uma menina com quem ele dividiu os horrores da guerra por um dia e de quem nunca se esqueceu. Ele faz um mergulho ao passado para tentar fazer as pazes com sua história. E mais uma vez eu me perguntei se é possível seguir realmente em frente após vivenciar uma guerra.

As partes do livro muitas vezes se mesclam, se confundem como na cabeça de uma criança (e às vezes nos confundem também). Entender o que aconteceu através do véu que cobre os olhos de uma criança pode ser meio complicado, mas eu confesso que, mesmo tendo lido bastante sobre a Guerra da Bósnia nos últimos dias, eu ainda sinto dificuldades em entender o que realmente aconteceu na desintegração da Iugoslávia e desencadeou os conflitos entre bósnios, sérvios e croatas. Uma combinação de fatores políticos, étnicos e religiosos levou a uma guerra que durou quase quatro anos e deixou cerca de 200 mil mortos e mais de 1 milhão de refugiados.

Talvez seja mesmo impossível tentar entender algo como “limpeza étnica” de forma racional. Usar a máscara da inocência infantil é uma boa forma de trazer um pouco de poesia ao horror. A ingenuidade dessa fase às vezes nem permite que se entenda a gravidade dos acontecimentos e eles ganham um sentido diferente, que nós precisamos traduzir. Na voz de Aleksandar, a história consegue ser leve e às vezes até divertida, apesar do assunto que aborda. Sem dúvidas foi um livro marcante!

Como o soldado conserta o gramofone foi publicado originalmente em alemão, em 2006, e em português em 2009, pela Editora Record. A tradução é de Marcelo Backes.

Mais alguns livros de autores bósnios:

  • O Projeto Lazarus, Aleksandar Hemon
  • O Livro das Minhas Vidas, Aleksandar Hemon
  • O Diário de Zlata, Zlata Filipović

Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.

38 Comments

  1. Waldir Reccanello

    Olá. Também tenho um projeto pessoal (ainda não compartilhado como o teu) de leitura de livros de vários países e, da Bósnia, eu li “O Diário de Zlata”, de Zlata Filipović. A crueldade da guerra, pelos olhos de uma criança, consegue ser ainda mais assustadora. Obrigado por compartilhar suas experiências! Vou tomá-las como um norte para meu projeto.

    • Camila Navarro

      Waldir, eu li esse livro quando tinha uns 13 anos e lembro que os relatos da Zlata me impressionaram demais. Nunca esqueci aquela experiência.

  2. Vim por referências de livros da Bósnia, que é meu próximo destino de viagem, justamente porque queria algo que talvez falasse de outro tema que não a guerra. Quando O diário de Zlata foi publicado, li pra escola, e aquela leitura me marcou profundamente, lá nos meus 12 anos, tanto que fui procurar referências atuais dela, que mora na Irlanda e produz filmes. Escolhi visitar uma Sarajevo que na minha memória foi trazida pelo relato de uma criança que teve de deixar sua cidade em meio a bombardeios. Acho que vai ser interessante ler outro relato sobre o tema, e vai ser impossível dissociar esta viagem da guerra. Mas nunca na vida imaginei, lá nos meus 12 anos, que um dia viajaria a Sarajevo.

    • Camila Navarro

      É tão difícil encontrar livros que não falem de guerras, conflitos, genocídios quando se trata de países que passaram por isso recentemente. Fácil de entender, né? Eu li O Diário de Zlata na mesma idade que você e também me impressionou muito na época. Se ainda estiver procurando um livro da Bósnia que não seja tão focado na guerra, parece que O Livro das Minhas Vidas pode ser uma boa. Não o li, mas pela sinopse tive essa impressão.

  3. Bela dica de livro! Está anotada!
    Se algum dia tiveres oportunidade, não deixa de ler “Ponte sobre o Drina”, de Ivo Andrić. Talvez a dica seja meio óbvia, já que é um autor premiado com o Nobel, mas a leitura é fantástica para quem quer entender a história daquela região conturbada.

  4. Lucimara Busch

    Camila, quanta história em Visegrad não? E se o Aleksandar fosse o mágico de capacidades? E que gracinha essa coisa toda dele com o vovô Slavko! Eu pouco sabia sobre essa guerra. Há um tempo atrás assisti um filme sobre esse assunto, e agora lendo o livro pesquisei um pouco. Eu lembrava que era bem recente. Acho que meu interesse pelo Holocausto (apesar de muito triste, sempre leio sobre isso) me fecha um pouco os olhos para as demais guerras. Não que eu goste, mas o próprio Holocausto mesmo eu considero algo recente! Tenho uma imensa paixão pelo Diário de Anne Frank, e creio que se ela não tivesse morrido, teria sido uma grande escritora! Pesquisei também sobre o autor Sasa, e vi pequenas entrevistas dele no youtube. O livro é de fato maravilhoso! Beijos.

    • Lucimara, acho que não é só você. Ainda se fala muito sobre o Holocausto (e é preciso mesmo falar, pois foi uma coisa horrível!), mas o mundo fecha os olhos para guerras que continuam acontecendo. Milhares de pessoas sofrem hoje nas mãos daqueles que brigam pelo poder, mas talvez só daqui alguns anos nós iremos perceber a dimensão disso tudo. Só não consigo entender de verdade nenhuma delas, pois para mim são todas absurdas…

      • Lucimara Busch

        É Camila, eu também não entendo, mas penso que uma boa parte é pela ganância! Lembrei agora também da Bomba de Hiroshima, que deixou as terríveis consequências da radiação, afetando milhares de pessoas, e até mesmo crianças que nasceram com problemas por conta disso. Infelizmente se a gente for procurar sobre apenas esse tema guerra, ainda vamos encontrar muita coisa…

  5. Carla Portilho

    ***SPOILERS***
    Meninas, estou escrevendo esse “spoilers” só mesmo para se algum visitante vier ler os comentários, porque, como estou bem atrás de vocês na leitura, nada do que eu vou dizer é novidade…

    Vejo muitos méritos nesse romance, embora ele não tenha se tornado um dos meus favoritos. Como a Ana Luiza, eu acho que a escolha foi perfeita para o projeto, e representou muito bem a Bósnia. Sempre me dá uma satisfação interior quando a escolha é adequada!

    Eu gostei muito da maneira como a narrativa foi estruturada. O romance conta duas histórias paralelas: a história da guerra e seus efeitos (na concepção de Aleksandar criança e adulto) e a história da formação de Aleksandar como escritor.

    A primeira parte é narrada pela voz infantil de Aleksandar. É interessante que essa narração é feita “ao vivo”, enquanto os fatos acontecem – não é o Aleksandar adulto narrando de memória, como seria mais comum. Essa parte já deixa claro, como vocês todas mencionaram, que Aleksandar não é uma criança como as outras – ele tem um olhar diferente sobre o mundo, um olhar incomum e muito criativo. O episódio do professor de redação marca bem essa “independência” dele como escritor, quando ele desenvolve o tema proposto do seu próprio jeito, e não se prende às amarras convencionais como o uso do travessão, por exemplo… A narrativa da guerra em si é feita de forma bem sutil, como seria de se esperar de uma criança que não compreende bem o que se passa. Nós, que sabemos que uma guerra está em curso, identificamos os fatos que ele narra através das sutilezas – e isso torna a narrativa não apenas mais leve, mas também mais poética. Uma cena assim que me chamou a atenção foi a do soldado com Amela, a moça que fazia pão – vi como um exemplo dos estupros sistemáticos que os sérvios usaram como arma de guerra, mas as crianças só percebiam o soldado com as mãos na massa do pão e os cabelos dela em desalinho. De todo modo, embora eu veja essas qualidades, pessoalmente essa parte foi a que menos me agradou – sempre me parece que narrativas de crianças resvalam um pouco para a pieguice (e não nego que deve ser bem difícil evitar isso, com uma temática dessas…)

    A segunda parte é o produto do trabalho do escritor Aleksandar – fragmentos, memórias esparsas, algumas experimentações…

    Na terceira parte, quando Aleksandar retorna, ele já é não apenas adulto, mas um escritor mais amadurecido, capaz de processar mentalmente o passado e suas consequências para o presente. Os experimentos narrativos ainda acontecem – alguns são meio chatinhos, como aquele capítulo em que ele telefona para um milhão de casas em busca de Asija, mas outros são bem interessantes. Nessa parte está o capítulo que eu considerei o mais tocante (e talvez o mais bem escrito) de todo o romance, aquele da partida de futebol durante a trégua entre sérvios e bósnios – os paralelos que ele faz entre o futebol e a guerra são perfeitos, no início do capítulo dá até para pensar que o jogo é apenas uma alegoria para a guerra.

    Enfim, esse romance foi uma escolha super acertada mesmo!

    • Carla, o mais legal de ler seus comentários “atrasados” é que eu releio minha resenha e os comentários já com um certo distanciamento e isso é bom também! :-)

      • Carla Portilho

        E é sempre gostoso trocar ideias sobre o que lemos, né? Mesmo que seja um tempinho depois…

        • Eu também Carla achei o capítulo da partida do futebol, incrível. E achei super interessante a paixão deles pelo futebol, que eu desconhecia e principalmente esse “timing” de ter descoberto essa paixão no momento em que a Bósnia se classifica para sua primeira copa!

  6. Acabei de ler o livro da Bósnia! O livro foi perfeito para esse projeto, Também pesquisei muito sobre a Iugoslávia, Tito, e fiquei morrendo de vontade de conhecer a Bósnia e os outros países. Porém confesso que continuo sem entender a guerra, e quem venceu afinal? Já no final do livro percebi que a guerra chegou até a família de Aleksandar, o pai e tio Bora ficaram sem falar com tio Miki.
    Concordo com Camila, Aleksandar não me pareceu melancólico antes da guerra, tinha uma família, bem estruturada, uma relação forte de muito amor com o avô Slavko, Mas com a morte do avô começa a conviver com as perdas.
    No início achei a leitura mais fácil, e leve no início, depois foi ficando confusa, e triste. Confesso que fiz força para terminar.

    • Ana Luiza, o vai e vem no tempo é que às vezes deixa a leitura meio complicada, né? Olha, mesmo lendo bastante sobre o assunto, achei essa guerra bem difícil de entender. Ainda bem que ainda iremos ler outros livros dessa região, então talvez depois tudo fique mais claro. Se é que é possível encontrar explicações para as guerras…

  7. Camila,

    Acabei de ler o livro e adorei! Talvez por tê-lo lido depois do livro da Malásia, nem o achei triste, como a Wanessa mencionou. O Aleksandar me pareceu uma criança sensível, mas não melancólico. E também fiquei morrendo de vontade de ver o Drina!

    • Pois é, Lu, acho que a guerra vista através dos olhos de uma criança pode ser bem menos cruel, por isso o autor conseguiu dar certa leveza à história. Para mim também foi uma leitura bem mais tranquila que a da Malásia.

  8. Wanessa Lima

    Camila, terminei ontem de ler Como o Soldado Conserta o Gramofone. Até agora, lemos 2 livros que retratam diretamente conflitos tão sangrentos que foram classificados como genocídios (e uma curiosidade jurídica é que tanto Ruanda quanto a Bósnia foram antecedentes que justificaram a criação de um tribunal penal internacional permanente, no âmbito da ONU).

    Achei o livro imensamente triste, não só pela história de guerra, mas porque Aleksandar é um dessas crianças melancólicas, que mostra que a infância não é necessariamente uma fase de alegria e despreocupação. Aliás, o livro não conta uma história, está mais para um emaranhado de episódios, e cabe ao leitor dar alguma ordem ao conjunto. Tive uma certa dificuldade com isso, porque a narrativa é tão randônica – o que não ajuda uma pessoa dispersa como eu… -, que só lá pelo meio é que consegui formar um panorama mais linear.

    Esse livro despertou muito a minha curiosidade pela história da Iugoslávia (TÃO complicada! Encontrei esta descrição do país, na época de Tito, que achei perfeita: “Seis repúblicas, cinco etnias, quatro línguas, três religiões, dois alfabetos e um Partido”), pelas paisagens locais (o Drina) e pelo siluro (você viu as fotos do bicho? É assustador! rsrsrs). Pensando seriamente em incluir a Bósnia no roteiro de uma próxima viagem à Europa.

    • Wanessa, até que eu não o achei melancólico antes da guerra e da morte do avô, apenas com uma imaginação muito fértil. Depois disso sim. E a perda do avô, que era a referência mais importante para ele, me pareceu ter sido um choque mais forte do que o exílio.

      A história é meio confusa mesmo, cheia de vai e vem. Às vezes eu demorava um pouco a me situar cronologicamente, mas entendi esse enredo como uma forma de tentar reproduzir a mente infantil. Não é fácil acompanhar, mas é interessante!

      Eu também fiquei muito curiosa com a história da Iugoslávia, mas minhas pesquisas só me deixaram mais confusa! Tentar entender essa colcha de retalhos que levou à guerra não é tarefa para leigos em política como eu.

      Quanto à vontade de conhecer os países nas próximas férias, isso está acontecendo com quase todos os livros que eu leio! Estou doida para conhecer a África, a Bósnia e minha vontade de ir ao Butão só aumentou… Esse projeto está me causando sérios problemas. rsrs

      • Wanessa Lima

        Camila, a minha impressão de que Aleksandar era melancólico mesmo antes da guerra vem do fato de ele ser tão singular, diferente (a típica vítima de bullying, pra ser bem atual). Ele tem essa percepção, porque se descreve como sendo o campeão de estranheza na escola, ganhando do segundo colocado com muita folga. Essa personalidade tão peculiar acaba gerando nas pessoas em volta incompreensão e falta de interesse pelo que ele pensa e sente (exceção feita ao avô). Para mim, isso aparece em dois episódios principalmente: na história do engenheiro italiano e na do professor de redação.

        • É, nesse ponto você tem mesmo razão. Ele não era uma criança como as outras. Mas, apesar dessa estranheza, ele me parecia uma criança feliz, sabe? Vivendo em seu mundo de imaginação, mas ainda assim feliz com a pesca no Drina e tudo mais.

          Foi bom você ter lembrado da história do engenheiro! Fiquei com pena dele pelo preconceito de que foi vítima (e que no fim das contas parece que não passava de fofoca) e tocada com sua atitude durante a guerra, enviando mantimentos e se preocupando com as pessoas. Queria que o Aleksandar tivesse entrado em contato com ele quando estava em busca de seu passado.

          • Wanessa Lima

            Acho que tivemos uma percepção diferente do Aleksandar mesmo, Camila. Talvez, ao chegar na parte sobre “quando tudo era bom”, eu não tenha conseguido me afastar da imagem construída na primeira parte do livro.
            Gostei muito da sua ideia para o desfecho da história do engenheiro! Eu também teria preferido se tivesse acontecido assim.

      • Carla Portilho

        Meninas, acho que eu posso dar uma luz sobre essa questão da história cheia de vai e vem… Vou tentar não deixar com cara de aula!

        Desde que o romance surgiu como gênero literário, na Europa do século XVIII, uma das suas características mais marcantes foi a narrativa linear. Ao longo do século XIX, com o apogeu dos romances realistas, essa característica se tornou ainda mais forte. É só a gente pensar nos grandes clássicos dessa época – são todas narrativas deliciosas, daquelas que pegam o leitor pela mão e conduzem ao longo da história. No século XX essa linearidade começa a se perder – a literatura vai se tornando mais fragmentada, as narrativas ficam cheias de vai e vem.

        A minha ex-orientadora diz que todos nós temos um pé lá no século XIX, e por isso temos tanto gosto por essa histórias bem-contadas, essas narrativas envolventes que não nos deixam largar o livro… Só que as narrativas contemporâneas provocam o leitor de outro jeito, perturbam, fazem com que ele tenha que “participar” mais da narrativa – daí a dificuldade que um romance menos linear apresenta… (Por outro lado, há também um prazer diferente ao “decodificar” essas narrativas – são leituras mais lentas, que exigem mais reflexão, mas também apresentam mais camadas de significados, de um modo mais semelhante aos contos…)

        A falta de linearidade aproxima a narrativa literária do pensamento humano. Na verdade, a gente não pensa de forma organizada, né? O pensamento é cheio de idas e vindas, de passado misturado ao presente e ao futuro… As narrativas contemporâneas tentam dar conta disso – e são, mesmo, mais complicadas de acompanhar do que a narrativa mais tradicional!

        • O #198livros tem sido uma boa mistura dessa literatura tradicional e de modelos mais modernos de escrita, né? Os livros que não seguem a estrutura linear exigem mais empenho para que possamos entender a história, né? São mais difíceis, não são meros passatempos, mas tenho gostado dessa experiência variada!

    • Carla Portilho

      Nem tinha me passado pela cabeça ir procurar fotos do siluro até ler o comentário da Wanessa. Caramba, o bicho é mesmo assustador!!! Mas depois fiquei dando risada quando me lembrei do episódio do siluro de óculos, rsrsrs…

  9. Wanessa Lima

    Camila, suas resenhas estão cada vez melhores! Infelizmente, também acho que vamos nos deparar com muitas histórias de guerra… Como o Soldado Conserta o Gramofone me interessou tanto – a começar pelo título – que nem pesquisei muita coisa sobre a Bósnia depois que li a descrição, porque já tinha decidido lê-lo.

    Eu me lembro de ter lido sobre O Diário de Zláta na época em que foi lançado aqui no Brasil (eu li na revista Capricho! rsrsrs), mas não tive acesso ao livro, acho que vou procurar por ele depois. Vi que ela lançou outro (VOZES ROUBADAS – Diários de guerra), que deve ser interessante, mas vai ser mais um pra depois dos 198!

    • Carla Portilho

      Comigo foi a mesma coisa: gostei tanto do título do livro que nem pesquisei nada sobre a Bósnia, acatei a escolha da Camila sem pestanejar!

      • Eu também nem cheguei a pesquisar muito. Digitei “autor bósnio” no google e encontrei o Aleksandar Hemon e o Saša Stanišić. Quando li uma resenha de “O soldado conserta o gramofone” já me interessei na hora também! Depois é que vi que a Ann Morgan tinha lido o mesmo livro e, apesar de as impressões dela não terem sido totalmente favoráveis, achei que seria legal ler um livro narrado por uma criança, até para variar um pouco o estilo. Espero que vocês também achem a experiência interessante!

        • Carla Portilho

          Meninas, terminei de ler O Soldado Conserta o Gramofone e estou ainda terminando de digerir não apenas o romance mas também toda a informação paralela que li sobre o assunto Bósnia nos últimos dias. Em meio a tudo isso, reli também a resenha da Ann Morgan e fiquei com uma impressão que tem se repetido – às vezes me parece que ela, por ter assumido o compromisso de ler tanto com prazo marcado, passou rápido demais por certas coisas e acabou não compreendendo direito o que leu… Tive essa clara noção ao reler a resenha que ela escreveu sobre O Soldado…

          • Carla, eu também levei um tempo para digerir toda a história, mas confesso que mesmo tendo lido o livro com calma e tendo pesquisado muito sobre o assunto, continuei confusa em relação à guerra e à salada étnico-religiosa daquela região.

            Também acho que o prazo da leitura pode afetar um pouco julgamento. Minha leitura nem se compara com a sua, pois sei que você lê de forma bem mais profunda e com um olhar mais atento e crítico, mas acho que se eu tivesse um tempo marcado para terminar um livro eu acabaria passando batido por algumas coisas. Muitas vezes preciso reler alguns trechos/páginas, volto no texto para conferir informações… Sem contar toda a leitura paralela para entender melhor a situação.

            • Carla Portilho

              Camila, eu acho que só mesmo um especialista na história daquela região deve compreender a política local – ou não, né? ;-) Pesquisei bastante na Internet nos últimos dias, mas a única conclusão a que chego é que os conflitos étnicos, religiosos e políticos ali são muito anteriores à história da própria Iugoslávia… Acredito (espero, ao menos!) que, conforme os outros países forem sorteados, a gente consiga ter uma visão melhor do assunto!

    • Sério, Wanessa? Que bom saber que tô melhorando nas resenhas. Penso e repenso no que escrever pra tentar dar uma idéia da história, mas sem contar demais, né? Aos poucos vai ficando mais fácil. :-)

      Eu li O Diário de Zlata quando tinha uns 13 anos. Hoje eu já não me lembro dos detalhes, só um panorama meio geral, mas na época fiquei super impressionada! Depois vou até dar uma olhada nos meus diários daquela época pra ver se eu mencionei alguma coisa!

  10. Lucimara Busch

    Olá Camila! Esse lugar está me ensinando muito! Já não consigo mais passar um dia sem vir aqui e ler as dicas, os comentários, e aprender sobre livros e novos escritores. E minha wish list aumenta cada dia mais! rsrs
    Parabéns pelo seu ótimo trabalho! A leitura é mesmo fantástica não é?
    Bj

    • Obrigada, Lucimara! Eu sempre gostei muito de ler, mas agora esse prazer está sendo ainda maior, não só por estar descobrindo um mundo novo na literatura, mas também poder compartilhar isso aqui. Estou adorando e fico super feliz quando recebo um comentário como o seu! :-)

      • Lucimara Busch

        Camila, eu também sempre gostei muito! E eu ainda não li nada comparado ao que eu tenho pra ler!rsrs
        Falta tempo! Muito tempo! Vou continuar por aqui porque a cada dia eu descubro uma coisa nova no mundo maravilhoso dos livros, e isso me fascina! :)

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