Às vezes eu tento fugir dos estereótipos ao escolher os livros para o projeto, mas em outras eles me parecem até mesmo necessários. Como falar sobre o passado recente da Colômbia sem mencionar o narcotráfico? Para entender a Colômbia de hoje, não há como ignorar o assunto. Então aproveitei para ler um livro que já havia chamado minha atenção desde que li a primeira resenha sobre ele: O ruído das coisas ao cair, de Juan Gabriel Vásquez. Na verdade, eu li a versão original em espanhol, El ruido de las cosas al caer – simplesmente porque eu sempre me assusto com o preço dos livros no Brasil e preferi a versão digital, que encontrei disponível no site da Amazon britânica.
O ruído das coisas ao cair conta a história de Antonio Yammara, um professor universitário que vive em Bogotá e que se vê ligado à vida e à morte de um colega que conhece na mesa de sinuca por um acaso do destino, em 1996. O colega é Ricardo Laverde, um ex-presidiário com quem Antonio tem afinidade, mas sobre o qual sabe muito pouco. Seu assassinato deixa traumas profundas em Antonio e ao investigar a morte de Laverde ele nos descortina o panorama colombiano na década de 80.
Temos então Bogotá em dois momentos: no auge do narcotráfico, durante o “reinado” de Pablo Escobar – quando os cartéis brigam entre si e o Estado luta contra eles, provocando uma onda de violência e terrorismo no país – e na década seguinte – quando a população que cresceu convivendo com essa violência precisa lidar com os conflitos psicológicos dela decorrentes em um país que ainda não conseguiu se desvincular totalmente de seu passado.
O livro nos traz duas histórias paralelas: a de Antonio e a de Ricardo. Eu achei que a parte em que conhecemos a vida de Ricardo se arrasta demais. São muitos detalhes e o autor volta muito no tempo, o que nos deixa distantes do enredo inicial por um longo período. Mas no geral eu gostei bastante do livro e acho que ele conseguiu cumprir sua proposta.
O que mais me impressionou foi pensar que talvez nós, brasileiros, estejamos indo pelo mesmo caminho. Não falo especificamente do tráfico de drogas, apesar de ele ter bastante relação com o que acontece hoje aqui, mas da influência que a violência urbana exerce nas pessoas comuns. Acho que também estamos nos tornando uma geração de pessoas medrosas. É triste pensar que somos vítimas da insegurança, que nos sentimos impotentes e que pautamos muitas escolhas diárias pelos perigos que elas representam. Eu já me sinto assim. Vocês concordam?
El ruido de las cosas al caer foi publicado originalmente em espanhol pela Editora Alfaguara, em 2011, e no Brasil em 2013, pela Editora Objetiva.
Mais alguns livros de autores colombianos:
- A ausência que seremos, Héctor Abad
- Os Informantes, Juan Gabriel Vásquez
- Rosario Tijeras, Jorge Franco Ramos
- La Vorágine, José Eustasio Rivera
- Los Hermanos Cuervo, Andrés Felipe Solano
- Fruit of the Drunken Tree, Ingrid Rojas Contreras
* Sentiram falta de Gabriel García Márquez nas minhas indicações e com toda a razão! Eu nem o coloco na lista de escritores colombianos, para mim ele é mais um escritor universal! Cem Anos de Solidão é um dos meus livros preferidos de todos o tempo, daqueles que eu nunca vou me cansar de reler. Se você ainda não leu, tá esperando o quê?
Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.
Oi Camila, que review sensacional! Adorei o seu questionamento pós livro, e sim, a violência está criando um mundo de adultos completamente assustados, ou melhor, previnidos.
De volta ao livro, eu com o meu idealismo de sempre fique triste com a maneira que Ricardo transformou seu sonho de ser piloto em “burro de carga” pela simples promessa do enriquecimento fácil. E aí, vejo mais uma similaridade de culturas, muitos brasileiros também preferem o caminho fácil, o do jeitinho e da maracutaia
Gostei do livro, mas não amei.
Agora rumo ao Laos!
Marina, eu pensei a mesma coisa. A entrada na criminalidade muitas vezes muitas vezes é um atalho. Uma bobeira que estragou o resto da vida dele, né?
Camila, Colombiano eu só tinha lido Gabriel Garcia. A história me prendeu a atenção. Mas é tão ruim quando a gente termina um livro que não tem um final feliz né? rs O livro é muito bom! E como comentamos outro dia ali abaixo, a gente sempre sempre quer o melhor, e não que o mundo nos jogue diariamente coisas erradas, infelizes, e que nos torne pessoas diferentes, com medo, etc, por vários motivos.
Eu já desisti de esperar finais felizes! Já reparou que a maioria dos livros bons termina de forma triste?
Já! Não vou mais criar expectativa. De repente me surpreendo.
Também gosto dos finais felizes ;)
Camila eu me encaixo nas últimas linhas da sua resenha. Hoje me privo de muitas coisas com medo de assaltos, violência, etc. No passado eu não sentia assim, não sei se porque era diferente ou se eu não tinha conhecimento dos perigos mesmo. Quando eu terminar o livro eu volto aqui. :)
É triste, né Lucimara? Não sei se nosso medo é proporcional à violência ou se a gente amplifica os perigos, só sei que é horrível viver assim. A gente se priva de tantas coisas por isso…
Eu queria que fosse diferente! Mas tem tanta coisa errada e infeliz nesse mundo.
Na última quinta, faleceu Gabriel Garcia Márquez, o autor de “Cem anos de Solidão”, “Amor em tempos de Cólera”, “Hojarasca”, entre tantos outros clássicos. Acho que ele merece ser lembrado na listinha de autores colombianos. O criador do realismo mágico e ganhador do Prêmio Nobel de 1982 (ano que eu nasci! rsrs) tinha uma visão de mundo fantástica e, ao mesmo tempo, muito próxima de todos nós, que vivemos nessa América Latina…
(tô encantada com seu blog!)
Abraços
Ana, acho que me esqueci de citar Gabriel Garcia Márquez no post porque é tão óbvio, né? Ele é um dos meus escritores preferidos e eu até citei “Cem Anos de Solidão” no post sobre o livro do Timor Leste. Na verdade, quando pedi indicações de livros colombianos no facebook e no instagram eu disse que os livros dele não valiam, pois seria injusto com outros autores. rsrs