198 Livros: Nigéria – Hibisco Roxo

198 Livros - Nigéria Às vezes eu fico fã de uns autores sem nunca ter lido quaisquer livros deles. Geralmente é por causa de entrevistas, de vídeos, de textos aleatórios publicados na internet. O bom é que até hoje eu não me decepcionei quando chegou a hora de ler um livro desses escritores que eu idealizo. Foi o que aconteceu com Mia Couto, por exemplo. Eu via as opiniões dele sobre diferentes assuntos e ficava morrendo de vontade de ler suas obras, pois alguém como ele só poderia escrever coisas boas. E eu estava certa! Li Terra Sonâmbula quando chegou a vez de Moçambique no #198livros e fiquei encantada e morrendo de vontade de ler mais e mais de Mia Couto. Com Chimamanda Ngozi Adichie foi a mesma coisa. Desde que comecei a ouvir falar dessa escritora nigeriana, eu soube que gostaria dela.

Uma das palestras de Chimamanda para o TED, O perigo de uma única história, tem tudo a ver com o meu propósito ao empreender essa jornada literária, que é derrubar preconceitos, abrir o meu olhar para o mundo (o vídeo está ali no final do post, para quem quiser assistir). Quando chegou a vez da Nigéria, eu não tive dúvidas de qual autor queria ler! Dos livros que ela já publicou, o que parecia se encaixar melhor no projeto era Purple Hibiscus, ou Hibisco Roxo, como foi chamado no Brasil, e foi esse o meu escolhido. Purple Hibiscus - Chimamanda Ngozi Adichie

O enredo de Purple Hibiscus gira em torno de uma rica família nigeriana, especialmente de Kambili, a adolescente que, junto com o irmão, Jaja, tem uma vida cheia de privações. O pai é um empresário bem sucedido e respeitado, caridoso aos olhos da sociedade, digno de prêmios em prol dos direitos humanos, mas que em casa é um fanático religioso, um tirano que pratica violência psicológica e moral contra a família. A mãe é mais uma vítima, submissa perante o marido.  Apesar disso tudo, a jovem Kambili parece ter adoração pelo pai. Ela não entende quando Jaja começa a se rebelar, de tão acostumada que está a seguir as regras impostas. Só quando eles saem de casa para passar uns dias com a tia é que as coisas começam a mudar.

A convivência com a tia e com os primos descortina um novo mundo para Jaja e Kambili. As diferenças começam pela condição social. A tia é uma professora universitária que batalha a cada dia para sustentar os filhos. Eles são pobres, vivem em uma casa apertada e sem nenhum luxo, mas ainda assim a vida por lá é muito mais alegre. É lá que Kambili descobre o som da própria risada, pois até então tudo o que ela sabia era chorar em silêncio. As descobertas não param por aí e quando eles voltam para casa é nítido que eles já não são mais os mesmos.

A Nigéria foi colonizada pela Inglaterra no final do século XIX e só obteve sua independência em 1960, logo seguida por uma ditadura militar e por uma guerra civil que devastou o país. Essa história não é diretamente abordada, mas mostra seus reflexos no livro. O pai de Kambili tem um papel importante na imprensa e precisa lidar com censuras, ameaças e corrupção para divulgar informações a respeito dos problemas políticos do país. Ele também representa os conflitos étnicos e religiosos que parecem marcar a região até hoje. Convertido pelos missionários que levaram o cristianismo à Nigéria no período colonial, ele renega as antigas tradições, personificadas no avô de Kambili, e perpetua a ideia de que o homem branco é superior. Em público Kambili e Jaja nem podem falar Igbo, a língua de um dos tipos étnicos predominantes no país, pois eles devem ser “civilizados” e falar inglês. Esse é um traço triste da dominação cultural imposta pelos colonizadores que eu já percebi em livros de diversos países com histórias recentes semelhantes.

Em muitos momentos a história é bastante incômoda. Acompanhar as atrocidades que o pai de Kambili comete foi angustiante. Se fosse um filme, eu viraria a cara em diversas cenas, sabe? É triste, é revoltante, é perturbador. Mas a gente vai percebendo o amadurecimento dos personagens e fica esperando por um final feliz, mesmo que ele pareça difícil de acontecer. Pra descobrir, só mesmo indo até o final.

Purple Hibiscus foi publicado originalmente em inglês pela Algonquin Books, em 2003. Em português ele foi publicado sob o título Hibisco Roxo pela Companhia das Letras.

Mais alguns livros de autores nigerianos:

  • Americanah, Chimamanda Ngozi Adichie
  • Things Fall Apart (O Mundo se Despedaça), Chinua Achebe
  • Foreign Gods Inc, Okey Ndibe

Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.

 

8 Comments

  1. Camila:

    Você já leu “O Olho Mais Azul”, da Toni Morrison? É bem interessante e muito bem escrito. Trata de tema semelhante.

    Fiquei curioso a respeito desta escritora.

    Obrigado pela recomendação.

    André
    http://viagenzinhahein.wordpress.com

  2. Camila,
    Adorei tudo que escreveu, e também tenho vontade de ler Mia Couto mas ainda não tive oportunidade. Eu crio uma historia de paixão com os livros, vou namorando de longe, sempre pego quando entro na livraria, paquero, contemplo, ate ele me conquistar e ganhar o direito de vir para casa para meu prazer. Loucura!!! mas e delicioso :)

    Estou com vergonha porque faz tanto tempo que não venho te visitar, lembro quando voce começou o blog, das primeiras visitas e fico muito feliz que tenha continuado, se dedicado o tanto que precisa, parabens ! E pretendo fazer parte desse projeto lindo dos 198 livros, acho muito bacana! Um beijo Patsy

    • Patsy, eu me lembro de você por aqui lá no inicinho do blog. Tem tempo, né? rsrs Adorei te ver por aqui!

      Sei que você também é uma leitora voraz, então tenho certeza de que iria adorar se juntar ao projeto! Não vai ser por falta de convite, hein? ;-)

  3. Lu Malheiros

    Camila,
    Resenha perfeita para um ótimo livro :-) E, sim, concordo que se fosse filme eu viraria a cara algumas vezes…
    Não tinha visto a entrevista, vou ver agora

  4. Lucimara Busch

    Camila, isso aconteceu comigo. Li um artigo dela e fiquei fã. Quero ler vários livros da Chimamanda. :)

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