Eu tinha preconceito com quadrinhos. Achava que era coisa de criança, sabe? Para mim eles até poderiam ser legais, mas daí a chamar de literatura era outra coisa. Era um preconceito cego. Tipo gostar de jiló sem nunca ter comido. Mas o Projeto 198 Livros tem como principal objetivo expandir meus horizontes, então nada melhor do que me provocar a conhecer diferentes estilos literários também. Quando chegou a vez do Irã, eu sabia que queria ler um livro escrito por uma mulher. Não faltavam romances interessantes, mas me desafiei a ler um quadrinho. Minha iniciação no mundo das HQs foi fácil, pois Persépolis, da escritora e ilustradora iraniana Marjane Satrapi, é quase una unanimidade.
Reparei que muitos livros contemporâneos em formato de quadrinhos são biografias. Persépolis não é exceção. Através de textos e ilustrações, Marjane Satrapi nos conta sua história da infância ao início da vida adulta. Ela tinha 10 anos quando ocorreu a Revolução no Irã, em 1979. Foi quando o país se tornou uma República Islâmica. Marjane e seus pais viviam em Teerã. Eram uma família moderna. Os pais eram politizados e Marjane estudava numa escola francesa. De repente ela se viu obrigada a usar véu e sentiu que sua liberdade estava sendo roubada.
Na adolescência as restrições ficaram mais fortes e incômodas. Jovens são rebeldes por natureza, imagina num regime como o iraniano! Marjane não podia nem ouvir as músicas de que gostava. Os pais não queriam que a filha crescesse naquele regime opressor e então Marjane foi estudar na Áustria, aos 14 anos. Ela descreve os percalços da vida de expatriada até seu retorno ao Irã, anos depois. É uma jornada interessante e a leitura em quadrinhos foi mais rica do que eu imaginava. Depois disso já até me aventurei a ler outro livros nesse formato (tudo bem que foi uma escolha do Leia Mulheres de Belo Horizonte, mas ainda assim já é um avanço).
O livro Persépolis virou filme. Os traços do papel foram animados na tela. A reprodução é bem fiel, até porque Marjane Satrapi dirigiu o filme ao lado de Vincent Paronnaud. Achei o filme um ótimo complemento à leitura, mas sem ler o livro antes acho que eu não teria conseguido absorver a história com todos os detalhes. É sempre assim, né? Apaixonadas por livros quase nunca acham o filme completo.
O mais interessante para mim foi conhecer um pouco do Irã antes e depois da Revolução. Eu nasci da década de 80 e desde que me entendo por gente vejo com o Irã como um país radical. Já faz algum tempo que eu aprendi a não confundir o povo com seus governantes, mas desde sempre para mim o Irã é um país em que os direitos das mulheres são violados. Não é estranho pensar que essa situação começou há menos de 40 anos? Isso me dá esperanças de que em poucas décadas as coisas sejam bem diferentes por lá.
Persépolis foi publicado originalmente em francês, em 4 volumes, entre os anos 2000 e 2003. A edição completa foi publicada no Brasil em 2007, pela Companhia das Letras. A tradução é de Paulo Werneck.
Mais alguns livros de escritores iranianos:
- Lendo Lolita em Teerã, Azar Nafisi
- O Livro do Destino, Parinoush Saniee
- Setembros de Shiraz, Dalia Sofer
- Rooftops of Tehran, Mahbod Seraji
- A Persian Requiem, Simin Daneshvar
- My Father’s Notebook, Kader Abdolah
- My Uncle Napoleon, Iraj Pezeshkzad
Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.
Também nunca leio quadrinhos Camila! Eu tenho esse outro livro, Setembro de Shiraz.
Eu comprei o Lendo Lolita em Teerã também, mas valeu a pena ler Persépolis e acabar com meu preconceito com quadrinhos. =)
Esse do Lolita também quero ler, um dia rs
Que bom que gostou do livro. Li Persepólis há alguns anos por indicação de um professor e confesso que também tinha certo preconceito quanto a livros em quadrinhos. Mas a história é tão envolvente que a leitura fluiu fácil e eu já li umas duas vezes depois disso. E eu tive as mesmas impressões com o livro, principalmente por retratar o Irã antes da revolução.
Difícil foi escolher só um livro para o Irã! Já comprei Lendo Lolita em Teerã também e estou doida para ler e conhecer mais sobre o país. Sem contar que morro de vontade de viajar até lá…
Que bom que gostou, Camila! Eu mesma, que esperava muito do livro, não me decepcionei! :-)
Como eu disse, esse livro parece ser uma unanimidade! ;-)