Belo Vale e a Fazenda Boa Esperança

Vocês já estão cansados de saber que eu sou apaixonada por cidades históricas. Felizmente nasci em um estado cheio delas e morando em Belo Horizonte eu tenho a chance de visitar algumas das mais charmosas cidades históricas brasileiras facilmente. Só que chegou o momento em que o Eduardo e eu já não estamos nos contentando apenas com as cidades. Agora estamos em busca também de fazendas antigas, afinal, no período colonial eram elas que concentravam as grandes riquezas. Foi pesquisando essas fazendas que o Eduardo descobriu que havia uma pertinho de Belo Horizonte em bom estado de conservação e aberta à visitação. E assim num sábado do mês passado lá fomos nós conhecer a Fazenda Boa Esperança.

Fazenda Boa Esperança- Belo Vale

A Fazenda Boa Esperança fica no município de Belo Vale, a cerca de 90 km de Belo Horizonte. Hoje a região é dominada pela mineração e, se pensarmos bem, sempre foi assim. A fazenda foi construída na segunda metade do século XVIII e em 1790 foi adquirida por Romualdo José Monteiro de Barros, o Barão de Paraopeba. Ele foi um político mineiro, mas também um fazendeiro que se dedicava à indústria e à mineração. Boa Esperança foi apenas uma de suas fazendas espalhadas por Minas Gerais. Além de produzir alimentos para abastecer a região de Ouro Preto, o Barão de Paraopeba também era dono de minas de ouro em Congonhas, sua cidade natal, hoje vizinha de Belo Vale.

Fazenda Boa Esperança- Belo Vale

Fazenda Boa Esperança

A Fazenda Boa Esperança hospedou Dom Pedro II diversas vezes em suas visitas a Minas Gerais. Quase 200 anos depois, ela recebeu outro visitante ilustre: o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade, que conheceu a fazenda quando trabalhava no Serviço do Patrimônio Histórico Nacional, hoje Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Ele teria dito que a Fazenda Boa Esperança era um “verdadeiro palácio”. Seu parecer em conjunto com o arquiteto Lúcio Costa e o historiador Salomão de Vasconcelos levaram ao tombamento da sede da fazenda em 1959.

Fazenda Boa Esperança

Fazenda Boa Esperança

Depois do Barão de Paraopeba, a Fazenda Boa Esperança teve vários donos até ser vendida ao Estado de Minas Gerais e então doada ao Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), em 1974. O tombamento do Iepha foi além do feito pelo Iphan e incluiu, além da sede, seus anexos e o conjunto paisagístico da fazenda.

Fazenda Boa Esperança

Fazenda Boa Esperança

Carlos Drummond tinha razão ao comparar a Fazenda Boa Esperança a um palácio. E olha que ele a viu antes da grande restauração que ocorreu após ela ser transferida ao Iepha, na década de 70. A sede está bem conservada, mas ficamos com a sensação de que ela deveria ser mais bem cuidada e aproveitada. O fato de ela estar quase vazia, sem  móveis ou adornos, deixa uma sensação de abandono nos visitantes. Fica difícil imaginar como era a vida ali no século XIX.

Fazenda Boa Esperança

Fazenda Boa Esperança

Mas o rapaz que nos recebeu na fazenda nos deu uma notícia muito boa. Ele disse que o Estado de Minas Gerais está terminando algumas obras de reparação e que então a manutenção da Fazenda Boa Esperança ficará a cargo do Inhotim. Encontrei uma notícia de dezembro de 2015 que confirma essa informação:

“O secretário anunciou que está sendo fechado um acordo entre o Governo e o Instituto para a manutenção da Fazenda Boa Esperança, uma propriedade do Estado que será transformada em área de conservação. Distante 40 km do Inhotim, sua manutenção ficará a cargo do instituto e poderá abrigar obras de arte e cursos de formação de restauradores.”

Espero que esses planos se concretizem logo!

Engenho da Fazenda Boa Esperança

Ao lado da casa há uma casa de pedras que era o engenho da Fazenda Boa Esperança. Há também um moinho de pedra, que parece não estar em tão bom estado, mas que não chegamos a ver. Outra parte que não vimos foi a capela com pinturas atribuídas ao Mestre Athayde. Ela é uma das joias da fazenda e estava sendo restaurada.

Engenho da Fazenda Boa Esperança

Já que estamos falando de uma fazenda do período colonial, é claro que há também a parte mais triste da história: a riqueza do Barão de Paraopeba era obtida graças à mão de obra escrava. As senzalas da Fazenda Boa Esperança abrigavam mais de 800 escravos. Hoje só restam ruínas das senzalas na área que circunda a sede, mas na parte de baixo da casa há uma espécie de porão que, de acordo com o rapaz que nos guiou pela fazenda, era o local em que ficavam os escravos domésticos. Quando começamos a abordar esse assunto, ele nos recomendou a visita ao Museu do Escravo, em Belo Vale, do qual falarei daqui a pouco.

Senzala da Fazenda Boa Esperança

Senzala da Fazenda Boa Esperança

Para fechar nossa visita à Fazenda Boa Esperança, deixo aqui um pequeno vídeo com algumas imagens que fiz lá para vocês verem um pouco mais dela.

Como chegar à Fazenda Boa Esperança

O acesso à fazenda é muito bem sinalizado. Fomos pela BR-040. No acesso à MG-442, ainda na BR-040, a placa já indica Belo Vale, a Fazenda Boa Esperança e o Museu do Escravo, logo após o pontilhão do trem. A gente passa pela cidade e então pega uma estrada de terra. É só seguir as placas, não tem erro. São cerca de 5 km numa estrada de terra em bom estado. Nosso carro não é nem um pouco apropriado para aventuras e deu conta do recado sem problemas. A Fazenda Boa Esperança recebe visitantes todos os dias, das 7h às 16h.

Estrada para a Fazenda Boa Esperança

MUSEU DO ESCRAVO

Depois do que vimos e da recomendação que recebemos na Fazenda Boa Esperança, corremos para Belo Vale a tempo de conhecer o Museu do Escravo. Por mais que eu já tenha estudado sobre a escravidão e visitado diversas construções em Minas Gerais que contam a história dos escravos e o que eles sofriam, a visita ao Museu do Escravo de Belo Vale foi impactante.

Museu do Escravo

Infelizmente não é possível fotografar as exposições do Museu do Escravo, mas logo de cara fomos apresentados a aparelhos de tortura que nos fizeram sentir vergonha de pertencer à raça humana. Quanta atrocidade o homem é capaz de cometer! A primeira parte da visita, dentro da casa, foi guiada, mas depois descemos para conhecer o restante sozinhos. Era horário de almoço e só havia uma pessoa no atendimento do museu, mas acho que em condições normais a visita pode ser toda guiada.

Museu do Escravo

O Museu do Escravo foi fundado pelo Padre Luciano Jacques Penido em Congonhas. Em 1977 ele foi transferido para a Fazenda Boa Esperança e em 13 de maio de 1988, no centenário da abolição da escravatura, foi inaugurado na casa em que se encontra até hoje, no centro de Belo Vale. Ela foi construída especialmente para abrigar o museu e sua arquitetura foi inspirada na Casa de Câmara e Cadeia de Mariana.

Museu do Escravo

O acervo do Museu do Escravo é enorme. São mais de 3 mil peças que contam a história da escravidão no Brasil e valorizam a cultura negra. É o melhor acervo desse tema que eu já vi. Falta um trabalho de museografia para valorizar a exposição e tornar a visita mais interativa, mas isso exige recursos e o museu é administrado pela Prefeitura de Belo Vale. Espero que algum investidor volte os olhos para o Museu do Escravo, pois ele possui um acervo único e conta uma história que precisa ser contada.

Museu do Escravo

O Museu do Escravo fica no centro de Belo Vale, ao lado da Matriz de São Gonçalo. Ele fica aberto de segunda a sexta, das 8h às 16h, e aos sábados, domingos e feriados, das 9h às 16h.  A entrada custa R$ 3,00 (valor em maio de 2016). Para mais informações, visite o site ou a página do Museu do Escravo no facebook.

BELO VALE

Já que estávamos por lá, é claro que aproveitamos para conhecer mais alguns pontos turísticos de Belo Vale. A Matriz de São Gonçalo, de 1764, vimos apenas for fora, pois estava fechada. Ela nem é a mais antiga de Belo Vale, mas é a mais acessível, já que fica no centro da cidade. Pena que não pudemos conhecê-la por dentro.

Matriz de São Gonçalo - Belo Vale

Ao lado da igreja fica o Casarão dos Araújos, bem mais recente, construído na década de 20, época em que o antigo arraial se desenvolveu. Ele já foi sede da prefeitura e hoje está sendo restaurado.

Casarão dos Araújos - Belo Vale

Dali seguimos para a Estação Ferroviária, observando algumas construções antigas e as casas dos trabalhadores da extinta Estrada de Ferro Central do Brasil.

Belo Vale

Belo Vale

E então chegamos à Estação Ferroviária, inaugurada em 1917 e recentemente restaurada. Por lá passava a Linha do Paraopeba, parte da estrada de ferro que ligava o Rio de Janeiro a Belo Horizonte. Até 1979 o trem de passageiros ainda trafegava por ali, mas desde então só se vê minérios passando pelos trilhos. Uma pena para todos nós…

Estação Ferroviária de Belo Vale

Estação Ferroviária de Belo Vale

BOA MORTE

Antes de partir, já pegando a estrada de volta, paramos para conhecer Boa Morte ou Comunidade Quilombola da Boa Morte, distrito de Belo Vale. A grande atração da comunidade é a Capela de Nossa Senhora da Boa Morte, cujos registros de construção datam de 1730, mas que só foi inaugurada em 1760. Sua restauração foi finalizada no final do ano passado e ela está com cara de nova. Pena que ela também estava fechada.

Capela de Nossa Senhora da Boa Morte

Capela de Nossa Senhora da Boa Morte

Boa Morte

E assim finalizamos nossa curta passagem por Belo Vale. Não vimos todas as atrações da região, mas ficamos felizes com o que tivemos tempo de conhecer. Se você está em Belo Horizonte, é um bate e volta bem tranquilo. Se vem de fora e está passando pela região, é uma ótima parada entre Congonhas e o Inhotim. Por falar em Inhotim, espero que tenhamos boas notícias da Fazenda Boa Esperança o mais breve possível! :-)


Fontes das informações históricas:

Veja todos os posts sobre a Estrada Real no Viaggiando.

5 Comments

  1. Marilda Maria Coelho

    GOSTARIA DE CONHECER ESTA FAZENDA. É RECEBIDO HOSPEDES NA FAZENDA.

    QUERO O ENDEREÇO GOSTARIA DE VISITAR. PODERIAM ME ENVIAR O ENDEREÇO E COMO CHEGAR. OBRIGADO.

  2. Dimas Coelho Perpetuo 31 988810947

    Camila Navarro, gostaria de encontrar você e te mostrar as coisas que tenho e que Iepha nem Inhotim nem ninguém tem. Tenho fotos originais das sapucaieiras baixinhas, tenho foto do quintal cheio de gado (iepha nem sabe que naquela fazenda se criava gado também). Num vídeo, o arquiteto do Iepha wellington Carvalho fala que Dom Pedro ll esteve na fazenda no final do século XVlll, como assim se ele nasceu no século XVX em 1825? etc…etc… etc…

  3. Leandro Marcos Dos Santos

    Ola! Eu gostaria de saber os nomes dos outros donos a quem pertenceu a boa esperança, pois hj fiquei sabendo por minha bisa que ela foi criada nesta fazenda, ela hj com 98 anos. Pela história contada por ela a fazenda também pertenceu a meu tataravô. Fiquei muito curioso com essa história, será que poderia me ajudar com os nomes?

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