198 Livros: Trinidad e Tobago – Menino de Ouro

198 Livros - Trinidad e TobagoNo final de 2020 eu assinei o clube do livro da editora Todavia. Em dezembro daquele ano recebi meu primeiro pacote e quando o abri tive uma boa surpresa. O livro era Menino de Ouro, da escritora Claire Adam. Fiquei feliz ao descobrir que ela era de Trinidad e Tobago, pais que eu ainda não havia lido no Projeto 198 Livros e para o qual estava tendo dificuldades em encontrar obras contemporâneas. Comecei a lê-lo quase de imediato e em poucos dias terminei a leitura.

Menino de Ouro conta a história de uma família de descendência indiana que vive na zona rural da ilha de Trinidad na década de 80. O pai, Clyde, trabalha em uma indústria do meio petroquímico e passa o dia todo fora. A pedido de sua esposa, Joy, ele trocou o turno da noite pelo do dia. Após um assalto com reféns na casa deles, ela está com muito medo. O casal tem dois filhos adolescentes, os gêmeos Paul e Peter.

Apesar de fisicamente idênticos, os irmãos são muito diferentes. Peter é considerado um gênio, enquanto Paul é tido como “retardado”. É esse o tipo de palavra usada para descrevê-lo, o que reflete não apenas uma ignorância das pessoas que o cercam, mas principalmente o contexto da época em que a história se passa. No capítulo que abre o livro ficamos sabendo que Paul sumiu. Enquanto procuram por ele, a história volta no tempo e assim vamos conhecendo o presente e o passado da família.

Menino de Ouro - Claire AdamEu, com meu olhar de mãe do século XXI, fiquei pensando no quanto os estereótipos criados desde a infância fizeram mau aos meninos. Peter tinha sempre que ser forte para proteger o irmão, além de ter que ser perfeito para atender às expectativas do pai. Enquanto isso, Paul era visto como desprovido de inteligência e menosprezado. E nós, leitores, temos o privilégio de entrar na cabeça de Paul e assim descobrir que o julgamento sobre ele estava errado.

Eu bem lembro como na década de 80 levar uma criança ao psicólogo era quase tabu, mas também um privilégio para poucos. Imagino que nesse e em outros pontos Brasil e Trinidad e Tobago não sejam muito diferentes.Ao mesmo tempo, é difícil julgar os pais que desejam que seus filhos tenham uma oportunidade melhor que a deles. Bom, no caso julgar especialmente Clyde, pois numa sociedade machista é ao homem da casa que cabe o papel de decisão.

Eu não sabia nada sobre a imigração indiana para Trinidad e Tobago e foi interessante conhecer esse aspecto cultural do país. A situação do colonizador é personificada na figura do padre Kavanagh, que pouco depois de chegar a Trinidad percebe que o homem branco ali tem muitos privilégios. Gostei também da ambientação do romance. A geografia, o clima e o modo de vida das pessoas são descritos de forma sutil ao longo do livro. Não pude deixar de reparar nas condições precárias em que vivem as pessoas menos favorecidas numa ilha caribenha considerada paraíso turístico. Quando o problema da falta de água é mencionado, me lembrei na hora do livro A Small Place, da escritora antiguana Jamaica Kincaid.

Principalmente a partir da metade Menino de Ouro tem um desenrolar que nos deixa apreensivos e desemboca num final que rende discussões acaloradas. Eu gostaria de ouvir outras pessoas falarem sobre ele em um clube de leitura. Gostei muito do livro e achei quele traz muitas camadas para serem discutidas. Ele chegou às minhas mãos no momento certo.

Menino de Ouro foi publicado originalmente em inglês, em 2019, e no Brasil em 2020, pela editora Todavia. A tradução é de André Czarnobai.

Saiba mais sobre o Projeto 198 Livros.

2 Comments

  1. Oi Camila. Discutimos esse livro no clube Leia Latinos, da Jéssica Mattos. Eu fui uma das que não gostou tanto…mas depois do encontro o livro cresceu mais.
    Tenho muitas ressalvas quanto ao final é aquele pai.. mas comecei a ler Naipaul e o seu Uma casa para o sr Biswas e entender um pouco mais sobre a cultura dos indianos em Trinidad e Tobago.
    Bjo

    • Camila Navarro

      Tanéia, eu assisti ao vídeo da Jéssica sobre o livro e imagino que a discussão tenha sido ótima! Agora estou lendo um livro de Santa Lúcia e essa questão dos indianos no Caribe está ficando mais clara para mim também.

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