Eu nem acreditei quando, um dia no twitter, vi um post sobre a iminente publicação de Sista, Stanap Strong!: A Vanuatu Women’s Anthology, uma coletânea de textos de escritoras de Vanuatu. Quem acompanha o #198livros desde o início sabe que as ilhas do Pacífico sempre foram minha maior dificuldade no projeto, então foi uma grande sorte contar com essa novidade antes que eu encerrasse minha volta ao mundo literária.
Sista, Stanap Strong! seria publicado em 2020, quando Vanuatu comemorou os 40 anos de sua independência da França. A pandemia e o ciclone Harold, que em abril daquele ano devastou Ilhas Salomão, Vanuatu, Fiji e Tonga, adiaram um pouco os planos. O livro foi publicado no ano seguinte e eu acredito que fui uma das primeiras pessoas a comprá-lo.
A antologia traz textos de mais de trinta mulheres de diferentes idades (dos 19 aos 80 anos!) sobre diversos assuntos. Elas falam de colonialismo, machismo, maternidade, racismo. Há contos, lendas, poemas e ensaios. Ficção e não-ficção. A maioria das autoras é ni-Vanuatu e vive no país. Quase todos os textos foram escritos em inglês, uma das línguas oficiais, junto com o francês e o bislamá, mas esse arquipélago composto por 83 ilhas é a casa de mais de 100 línguas indígenas. A introdução do livro, escrita por Mikaela Nyman e Rebecca Tobo Olul-Hossen, traz essas e muitas outras informações e por si só já daria muito papo para conversa.
Apesar de muito diversas, as histórias às vezes conversam entre si. Em uma temos a população local sendo explorada e vivendo situações muito parecidas com as que negros e indígenas sofreram no Brasil colônia, por exemplo, enquanto em outras temos relatos de brancos sendo vistos com hostilidade em tempos mais recentes.
Como são muitos textos, é difícil elencar meus preferidos, mas alguns me marcaram. Um deles foi “A Christmas miracle”, de Busi Vasconcellos-Neill. Ela fala sobre Hollingsword, ou Holen Wolul, que era seu assistente nas aulas de natação para crianças. O esporte é recente em Vanuatu e lá não existe nem mesmo uma piscina de 25 metros para treinamento. Holen foi o primeiro nadador do país a chegar ao Campeonato Mundial de Natação e seu sonho eram as Olimpíadas, mas em 2019, com apenas 19 anos, Holen descobriu ser portador de um tipo raro de leucemia e precisou de um tratamento caro e urgente. Vanuatu é um país pobre, com alto custo de vida e com um precário sistema de saúde, então o tratamento de Holen teve que ser feito na Austrália, onde o preconceito contra aqueles que “não tem o tipo certo de passaporte” me impressionou, apesar de não surpreender.
Outro texto de que gostei muito foi “A letter to Vanuatu: Unkept Promises”, de Kali Regenvanu, a mais nova das escritoras presentes na antologia. Reproduzo um trecho a seguir:
“Vanuatu, you have taken from me.
You have stolen from me my rightful property: my freedom. You have taken it and altered it beyond recognition, twisting it into free doom. You have twisted this Pacific paradise into an unholy hell for women, soaked in misery from decades of our tears – the tears of the women you have crushed under your weight.
Vanuatu, though banning plastic straws has earned you the global title of underdog David to the world’s Goliath, do not fool yourself. Whereas banning straws is a step towards a sunny horizon, your history of wrongdoing to those who live within you places you a hundred steps behind. How can you sleep at night, knowing our nation cares more for the wellbeing of distant beings in the ocean than your very own kin? The ones that gave you life without whom you would not exist.”
Quando li o livro das Ilhas Marshall, fiquei incomodada com a ausência de mais mulheres e com a forma com que elas são representadas na história, então para mim foi uma grande alegria ter acesso a Sista, Stanap Strong!. Eu gostei muito de conhecer essa obra e adoraria ver mais iniciativas como essa se espalhando pelo mundo.
Sista, Stanap Strong! foi publicado originalmente na Nova Zelândia em inglês, em 2021, pela Victoria University Press.
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